domingo, 28 de fevereiro de 2010

O Leigo

Um mar de poeira negra. Dizem que brotou do ódio e inveja que os Primordiais nutriam dos Mannun, a raça primitiva. Mas isso é apenas um mito, pois sua origem é muito mais obscura que seus grãos de areia...

“Há muitos séculos, esse território pertencia a Sutekh, o Desolado. Ele imperava ao lado de seus irmãos, os antigos governantes dos mannun de Kemet. Eram eles: Ausar, o Poderoso - seu gêmeo -, Isis, a Protetora – companheira de seu irmão - e Nephthys, a Senhora – que era também sua esposa -, todos sucessores da grande dinastia de Geb.

Ausar era um rei sábio, que trouxe civilização e prosperidade às suas terras, graças à sua tenacidade e ao Setro de Rá, um aparato místico de grande influência. Mas tal prosperidade chegaria ao fim.
Sutekh, que reinava nos desertos, invejava seu irmão, seus privilégios, seus poderes e, principalmente, sua relação estável com a mulher. A paranóia crescia, alimentada pelo demônio de olhos verdes da cobiça, a tal ponto que brotou a suspeita de uma traição entre ele e sua consorte, colocando em jogo a paternidade de seu herdeiro, Anupu. Inundado de ira, engendrou um plano para executar o suposto traidor.
Auxiliado por setenta e dois conspiradores, Sutekh convidou Ausar para um banquete em seu palácio. No decurso da festa, ele exibiu uma magnífica cápsula estelar que prometeu entregar a quem nela coubesse. Os convidados tentaram ganhar a prenda, mas ninguém conseguia preenchê-la adequadamente, dado que o ardiloso monarca havia projetado o presente para as medidas de seu irmão. Incitado pelo anfitrião, Ausar acaba entrando no invólucro. Os traidores o trancam e o queimam vivo dentro da armadilha. O gêmeo traiçoeiro finalmente possuia o tão desejado orbe de Rá e o controle dos feldos.


Todavia, a arrogância e a violência de seu reinado fizeram muitos virarem as costas para o novo Senhor, inclusive Nephthys que uniu-se à Isis na liderança das facções rebeldes que tentavam derrubá-lo. Sutekh, após anos de revoltas e guerras, foi finalmente morto pelo sobrinho Haru, o Falcão. Com a mágica do setro, o jovem lacrou a alma do derrotado nas areias de Kemet, que enegreceram-se como um abismo. Nasciam assim as Dunas de Sutekh


Já faz anos que não me assombro mais com o fato de tomar ciência de histórias íntimas, até mesmo esquecidas, de desconhecidos à minha volta, apenas me concentrando em seus sonhos e delírios. Foi assim que essa tragédia veio até mim. Foi o próprio irmão aprisionado nesta terra que me contou sua sina através de seu pesadelo eterno. Sim, eu entrei no sono de Sutekh.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O Leigo

O que ocorreu até agora não importa. Aliás, nada importa nesse momento. Minha mente se rebela em vão, ao passo que meus cabelos se tornam cada vez mais pesados, cobertos de areia. Meu nariz está a cada minuto mais seco e castigado pela falta de umidade, complicando a respiração, enquanto meus olhos mal se mantêm abertos na medida em que enfrentam a ventania agourenta. Meus ouvidos apenas ouvem o som dos trapos que eu visto quando são agitados pela força dessa interminável tempestade. Pelo menos a areia está fria, tornando meus passos menos desagradáveis, mas não menos difíceis, penso eu. Por isso continuo vagando, sem saber aonde é o meu destinatário. De repente tudo para. A tempestade cessou e então tomo coragem para abrir meus olhos lentamente. Vejo apenas as Dunas de Sutekh banhadas pelas imensas Luas que iluminam a noite fria e mais nada. Para meu azar ou sorte estou sozinho nesse mar de poeira negra...